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A Páginas Tantas

Ideias luminosas

Friccionando um pente de plástico em lã, transmite-se ao pente uma ligeira “carga” elétrica estática que pode atrair pequenos objetos como pedaços de papel. Os antigos gregos sabiam disto. Tales, que viveu por volta de 600 a.C., descreveu a forma como um pedaço de âmbar friccionado no pelo de um gato conseguia atrair objetos minúsculos e fazer faíscas.

No século XVI, William Gilbert, médico da rainha Isabel I, descobriu que conseguia fazer com que outras substâncias, como a lenhite (um tipo de carvão) e o vidro, fizessem o mesmo. Gilbert usou o termo electricus — de elektron, âmbar, em grego — para descrever o fenómeno. No início do século seguinte desenvolveram-se muitos aparelhos para produzir energia elétrica, mas os cientistas não conseguiam armazená-la nem controlá-la.

Na década de 1870, o biólogo italiano Luigi Galvani descobriu que, ao aplicar uma carga elétrica nas pernas de uma rã morta, conseguia fazê-las mexer. Um dia, uma perna de rã saltou quando lhe tocou com uma faca, sem usar eletricidade. Galvani pensou que a perna devia conter a sua própria eletricidade, mas o seu colega Alessandro Volta discordou, considerando que o fluxo de eletricidade se devia à entrada em contacto de dois metais diferentes — a faca e o tabuleiro metálico — devido ao músculo húmido da rã.

Volta usou dois metais para produzir eletricidade. Em 1800, construiu uma pilha de discos de zinco, prata e cartão embebido em água salgada. Ao unir as duas extremidades da pilha com um arame, a eletricidade atravessou-o! Esta “pilha voltaica” foi a primeira a ser construída. Numa pilha, dá-se uma reação química entre dois metais e um líquido que produz um fluxo de eletricidade.

Os cientistas dispunham agora de uma fonte de corrente elétrica que fluía constantemente, o que abriu novos horizontes de pesquisa sobre os meios necessários para gerar e acumular eletricidade.

Após a descoberta do eletromagnetismo, começou a pensar-se na possibilidade de se extrair dele eletricidade. O cientista inglês Michael Faraday realizou uma série de experiências em laboratório e, em 1831, descobriu a indução eletromagnética, o princípio por trás do gerador e do transformador elétricos.

Faça-se luz!

Em 1846, praticamente vindo do nada, um homem chamado Frederick Hale Holmes patenteou uma lâmpada de arco voltaico elétrica. A luz de Holmes era criada gerando uma corrente elétrica forte, forçando-a a saltar entre duas varetas de carbono — um truque exibido, mas não patenteado mais de quarenta anos antes. Não se sabe quase nada acerca de Holmes — as suas origens, os antecedentes académicos, ou como aprendeu a dominar a eletricidade. Tudo o que se sabe é que trabalhou em Bruxelas, onde desenvolveu o conceito, após o que regressou a Inglaterra, levando a invenção ao grande Michael Faraday.

A primeira lâmpada foi instalada no farol de South Foreland e eletrificada a 8 de dezembro de 1858. Funcionou durante treze anos e instalaram-se outras em diferentes localizações, mas a iluminação de arco nunca foi um êxito por ser complicada e dispendiosa. A única coisa que se pode dizer a favor das lâmpadas de arco voltaico é que eram extremamente brilhantes. Foram usadas para iluminar muitas ruas e monumentos parisienses na década de 1870, tornando-se uma sensação. Eram, no entanto, demasiado brilhantes para uso doméstico.

O princípio da iluminação incandescente já fora entendido, e até dominado, havia muito tempo, mas era necessário um filamento doméstico prático que ardesse com luz estável durante períodos longos.

A investigação mais determinada e bem desenvolvida foi levada a cabo por Thomas Edison, o principal inventor americano. Edison não era um ser humano particularmente atraente. Não tinha problemas em enganar, ou mentir, e estava preparado para roubar patentes, ou para subornar jornalistas por uma cobertura favorável. Segundo as palavras de um contemporâneo, ele tinha «um vácuo a ocupar o lugar da consciência». No entanto, era empreendedor e esforçado, e um organizador sem par.

Edison enviou homens para os cantos mais remotos do mundo, em busca de filamentos potenciais, e, numa ocasião, chegou a ter equipas a trabalhar em 250 materiais simultaneamente, na esperança de encontrar um com as características necessárias de permanência e resistência. Experimentaram tudo, até mesmo pelos da exuberante barba ruiva de um amigo da família.

Edison ligou a primeira instalação elétrica num bairro de Manhattan, em torno de Wall Street. Nem tudo correu bem. Os cavalos mostraram-se irrequietos, até que se percebeu que a eletricidade que se escapava fazia com que as ferraduras dessem choque.

Edison revelou excelência, acima de tudo, enquanto organizador de sistemas. A invenção da lâmpada foi uma coisa espantosa, mas não teria grande utilidade prática se não existisse um casquilho onde a enroscar. Edison e os seus incansáveis trabalhadores tiveram de conceber e construir todo o sistema a partir do nada, desde centrais elétricas a cabos baratos e de confiança, a candeeiros e interruptores.

Segundo os padrões atuais, essas primeiras lâmpadas eram muito fracas, mas para as pessoas da época uma luz elétrica era um milagre.

À medida que a eletricidade se foi generalizando, as pessoas sentiram-se perturbadas por o seu conforto depender de uma força invisível que podia matar de forma rápida e silenciosa. A maior parte dos eletricistas recebeu formação à pressa e nenhum tinha experiência, como é óbvio, pelo que rapidamente se tornou uma profissão para os temerários. Os jornais publicavam relatos pormenorizados sempre que alguém se eletrocutava, o que acontecia com alguma frequência.

Durante os primeiros anos ninguém se lembrou de criar tomadas, pelo que qualquer eletrodoméstico caseiro tinha de ser ligado diretamente ao sistema. Quando as tomadas surgiram finalmente, por volta do dealbar do século vinte, apenas eram disponibilizadas como parte integrante dos candeeiros de teto. Em breve seguiram-se as tomadas de parede, mas estas nem sempre eram dignas de confiança. As primeiras costumavam fumegar e, por vezes, lançavam faíscas.

A década de 1890 foi um período de depressão e o crescimento do consumo foi refreado. Contudo, a iluminação elétrica acabou por se revelar irresistível. Era limpa, estável, de fácil manutenção e ficava disponível quase de imediato e em quantidades ilimitadas com um mero ligar de interruptor. A iluminação a gás demorara meio século para se estabelecer, mas a elétrica impôs-se muito mais depressa. Nos EUA, o consumo de eletricidade passou de 79 quilowatts-hora per capita em 1902 para 960 em 1929, e para bem mais de 13.000 nos nossos dias.

Bryson, B. Em casa: breve história da vida privada. Bertrand Editora.
Claybourne, A. (2010). A história da ciência. Texto.
Ilustração: Marián Meza

“Science is organized knowledge. Wisdom is organized life.” – Immanuel Kant