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A Páginas Tantas

A belíssima Oshokun

Yuan dos Han, um jovem imperador da nobre linhagem dos Han, tinha tantas esposas que não sabia o seu número exato. A tradição exigia que, todos os anos, os altos dignatários da corte lhe oferecessem as suas filhas mais belas.
Ora, nesse tempo, apresentou-se na corte um embaixador do país dos Hunos. A guerra tinha-se prolongado durante muito tempo entre esse território selvagem e o Império. Yuan, um imperador sensato, desejava a paz. Recebeu os bárbaros com cortesia e amabilidade e decidiu oferecer-lhes um presente que os lisonjeasse. Mas o quê? Aquela gente grosseira não gostava de porcelana fina, nem de caixas lacadas, nem de jade, nem de sedas de tons delicados.
— Senhor, — disse o primeiro ministro. — Permitis-me uma sugestão?
O imperador aquiesceu.
— Ofereçamos ao rei bárbaro uma das suas mulheres.
— Oh! — exclamou a multidão de cortesãos indignados.
— Senhor, é o único presente que selará definitivamente a paz entre os nossos dois países.
— Seja! — decidiu o imperador.
— Vossa Majestade quererá certamente designar de entre as vossas esposas a que tiver menos atrativos, o que será ainda uma honra extraordinária para esses bárbaros.
— Que assim seja, — disse o imperador. — Ordeno que os pintores da corte façam o retrato de todas as minhas esposas, para que eu escolha a que deverá partir.
A notícia correu como fogo de palha. Os pintores da corte prepararam-se para fazer o retrato de todas as esposas. A menos bela, a menos desejável, partiria exilada para regiões distantes.
Nenhuma queria partir e servir de brinquedo a um rei bárbaro. Todas tentaram ganhar para a sua causa os pintores da corte e esforçaram-se por se apresentar o melhor que conseguiram. Cuidaram do rosto ao infinito, não poupando unguentos nem maquilhagem, alisando os cabelos, ornando-se de joias. Rivalizaram em lisonjas, sorrisos e gentilezas para com os pintores da corte. Todas realçaram as faces e a fronte com pó de ouro. Todas, exceto uma.
Oshokun era bela, de uma beleza tão evidente, tão luminosa, que as outras mulheres ficavam ofuscadas na sua presença como a luz das lanternas na claridade das manhãs. Ela apresentou-se perante os pintores, quando a sua vez chegou, sem enfeites, sem joias, a cara lavada, e não procurou seduzi-los. Os pintores, vexados pela sua atitude, acrescentaram-lhe traços grosseiros, que desfearam maldosamente o seu rosto maravilhoso.
O imperador recebeu os retratos. Eram todos parecidos, exceto um, singularmente nu e sem enfeites. Ele designou Oshokun e comunicou a sua escolha aos emissários estrangeiros. Determinou que a mulher, que nunca tinha visto, se preparasse para partir para o país bárbaro. Mas à noite, antes de adormecer, reviu aquele rosto estranho e hesitou. Resolveu não pensar mais nisso. “É necessário dar um presente ao rei bárbaro,” pensou. “E já que tenho que sacrificar uma das minhas esposas, mais vale escolher a menos sofisticada, a menos sensível às delicadezas da corte.”
No dia seguinte, porém, a meio da manhã, ordenou bruscamente ao camareiro-mor que lhe fosse buscar Oshokun para a ver antes de a entregar ao embaixador dos Hunos. Então, Oshokun entrou na sala do trono e foi como se uma carícia de primavera, uma cerejeira em flor, aparecesse diante dos seus olhos maravilhados. Oshokun mantinha-se direita, orgulhosa e bela, duma beleza inaudita, que lhe trespassou o coração. Ela mantinha os olhos baixos, sem falar, e ele amou-a. Quando Oshokun, por sua vez, ousou olhar o jovem imperador, petrificado no trono, o seu coração jovem fraquejou também ela soube o que era o amor.
O imperador tinha dado a sua palavra, anunciando a sua escolha aos dignatários da corte, e os emissários estrangeiros iam voltar para o seu país. O destino estava traçado. Assim viveram na melancolia o resto dos seus dias, a belíssima Oshokun e o seu amado imperador. Assim foi relatado nas coisas do passado.

Fonte: Os melhores contos Zen. Editorial Teorema.

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