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A Páginas Tantas

O mercador e o génio

Conto de As mil e uma noites

Havia outrora um mercador que possuía grandes bens, tanto em terras como em mercadorias e dinheiro. Tinha à sua disposição um número considerável de empregados, feitores e escravos. Um dia, em que um negócio importante o chamou para longe, montou a cavalo e partiu com um alforge no qual guardou algumas tâmaras. Sem acidentes, chegou ao destino e tratou dos seus assuntos.

No regresso, desviou-se do caminho para se refrescar sob umas árvores. Apeou-se, sentou-se junto de uma fonte de água cristalina, comeu as tâmaras e lançou os caroços para longe. Concluída a refeição, fez as suas preces. Não tinha ainda terminado quando viu surgir um génio enorme que, avançando para ele de sabre na mão, gritou, furioso:

— Levanta-te, que te quero matar como mataste o meu filho!

O mercador ficou horrorizado e respondeu, tremendo:

— Como posso ter matado o vosso filho? Não o conheço, nunca o vi!

— Quando atiraste os caroços, — respondeu o génio — um deles atingiu-o.

— Certamente, não o matei! Suplico-vos que me perdoeis e deixeis prosseguir caminho.

— Não, não! — Gritou o génio, persistindo na sua resolução. — Tenho que vingar o meu filho.

— Não há palavras que vos possam comover? Quereis realmente tirar a vida a um pobre inocente?

Quando o mercador viu que o génio lhe ia cortar a cabeça, gritou:

— Parai! Mais uma palavra, por misericórdia! Tende a bondade de me conceder uma prorrogação. Dai-me tempo suficiente para me despedir da minha mulher e dos meus filhos. Regressarei depois e submeter-me-ei a tudo o que vos aprouver.

— Mas, se te conceder a prorrogação que me pedes, temo que não voltes mais.

— Acreditai no meu juramento. Juro-vos, e Deus é minha testemunha, que virei sem falta encontrar-vos aqui.

— De quanto tempo precisas? — Perguntou o génio.

— Peço-vos um ano para regularizar os meus negócios, preparar-me para renunciar sem pesares ao prazer da vida. Prometo-vos que dentro de um ano, infalivelmente, estarei sob estas árvores, à vossa disposição.

Àquelas palavras, o génio, deixando-o junto da fonte, desapareceu.

Recuperando-se do susto, o mercador prosseguiu viagem. Quando chegou a casa, a mulher e os filhos receberam-no com alegria. O mercador, porém, começou a chorar amargamente.

A mulher perguntou-lhe a causa daquelas lágrimas e daquele sofrimento.

— Ai de mim! — Respondeu o mercador. — Só me resta um ano de vida!

E contou-lhes o que se passara entre ele e o génio. Ao ouvirem a notícia, a mulher e os filhos ficaram desolados.

No dia seguinte, o mercador tratou de pôr em ordem os seus negócios. Pagou as dívidas, distribuiu presentes aos amigos, deu grandes esmolas aos pobres, libertou os escravos, dividiu os bens entre os filhos e devolveu à mulher tudo quanto lhe pertencia pelo contrato de casamento.

Entretanto, o ano passou e foi preciso partir. O mercador preparou o seu alforge, onde colocou o lençol com o qual devia ser enterrado. Antes de iniciar a viagem, despediu-se:

— Meus filhos, ao partir, nada mais faço senão obedecer a Deus. Aceitai corajosamente esta necessidade e lembrai-vos de que o destino do homem é morrer.

Quando, no dia prometido, chegou ao lugar onde encontrara o génio, apeou-se e sentou-se junto à fonte. Enquanto esperava, um ancião que levava uma corça pelo cabresto, aproximou-se. Saudando-o, perguntou:

— Meu irmão, posso saber por que viestes a este lugar tão deserto, onde só existem espíritos malignos e é perigoso parar por muito tempo?

O mercador, satisfazendo a curiosidade do ancião, contou-lhe a aventura que o forçava a estar ali. O ancião ouviu-o, espantado, e disse:

— Eis aí a coisa mais surpreendente deste mundo! E vós vos ligastes pelo mais inviolável dos juramentos. Quero testemunhar o vosso encontro com o génio!

Enquanto conversavam, chegou outro ancião, seguido de dois cães negros. Aproximando-se deles, saudou-os e perguntou-lhes o que faziam naquele lugar tão solitário. O ancião que levava a corça contou-lhe a história do mercador.

O segundo ancião sentou-se e, mal havia começado a participar da conversa, apareceu um terceiro ancião. A situação pareceu-lhe tão extraordinária que quis testemunhar o que sucederia em seguida. Sentou-se também.

Instantes depois, viram um turbilhão de pó erguido pelo vento que avançou para eles e se dissipou repentinamente. Sem os saudar, o génio aproximou-se do mercador, empunhou o sabre e, agarrando-o pelo braço, disse:

— Levanta-te, para que eu te mate como tu mataste o meu filho!

Quando o primeiro ancião viu que o génio avançava para o mercador, lançou-se aos seus pés e disse:

— Príncipe dos génios, suplico-vos humildemente que me concedeis a graça de escutar-me. Vou contar-vos a história desta corça. Se a achardes mais maravilhosa e surpreendente que a aventura deste mercador, cuja vida quereis tirar, posso esperar para ele o perdão de um terço do seu crime?

O génio acedeu e, após ouvir a extraordinária história do ancião, concedeu um terço do perdão ao mercador. Em troca do segundo terço, o segundo ancião prometeu contar-lhe a história dos cães negros. Curioso, o génio concordou. No final, encantado pela narrativa, descontou o segundo terço do crime pelo qual culpava o mercador.

Por fim, o terceiro ancião perguntou ao génio se concederia o último terço do perdão caso a sua história superasse pela singularidade as anteriores. O génio fez-lhe a mesma promessa.

Acontece que a última narrativa era tão maravilhosa, pela diversidade das suas aventuras, que o génio não teve outra alternativa senão conceder o último terço do perdão ao mercador, que foi salvo pelas histórias dos anciãos.

Com grande alegria dos quatro homens, o génio desvaneceu-se.

O mercador agradeceu aos seus salvadores, que se congratularam por vê-lo fora de perigo. Depois, despediram-se, seguindo cada um o seu caminho. O mercador voltou para a companhia da mulher e dos filhos e com eles viveu tranquilo o resto dos seus dias.

  1. Resolve as palavras cruzadas da autoria do 12.º B.

  2. Encontra as palavras ocultas na Sopa de Letras.

Imagem: People illustrations by Storyset

“Stories are a communal currency of humanity.” – Tahir Shah