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A Páginas Tantas

Laissez-faire, a ideia de mercado livre

“Não é da benevolência do talhante, do cervejeiro ou do padeiro que esperamos o nosso jantar, mas da atenção que eles dedicam aos seus próprios interesses.” – Adam Smith

Ilustração: Mohammad Sh

O economista escocês Adam Smith é tido como o fundador do liberalismo devido à publicação do livro A riqueza das nações, em 1776. Nesta obra, afirmava que era a lei da oferta e da procura que estruturava o mercado. “O esforço natural de cada indivíduo para melhorar a sua própria condição” devia ser o fundamento de todos os sistemas políticos, económicos e morais.

Para Adam Smith, os impostos são prejudiciais: violam a liberdade individual e distorcem o natural funcionamento do mercado. Acreditava que o Estado devia intervir o menos possível na economia, pois os próprios interesses particulares conduziriam ao bem comum.

A longo prazo, a sua visão optimista do fluxo natural da riqueza dos mais ricos para os mais pobres provou ser falsa: a revolução industrial do século XIX e a “economia do conhecimento” do século XX criaram profundas desigualdades entre as várias classes e países. Porém, durante muito tempo, a fórmula de Adam Smith pareceu ser aplicável pelo menos em parte: os capitalistas da era industrial aumentaram os salários dos seus trabalhadores para estimular a procura e os economistas acreditaram poder erradicar a pobreza tal como a medicina esperava curar as doenças.

A riqueza das nações de Smith surgiu no ano da Declaração de Independência dos EUA. Para ele, os regulamentos imperiais que limitavam a liberdade comercial e industrial das colónias eram “uma evidente violação dos mais sagrados direitos da humanidade”. Os EUA permaneceram um expoente máximo do liberalismo económico desde então e um exemplo claro de como o laissez-faire funciona.

A ideia de “interesse particular esclarecido” significa, na prática, que a ganância é benéfica. Smith não deixou espaço ao puro altruísmo. Julgou que os comerciantes e usuários serviam os seus semelhantes ao comprar barato e vender caro — eis uma das lacunas do seu raciocínio. Outro erro foi o facto de assumir que os indivíduos tinham boas intenções em relação ao mercado e ao bem comum. Contudo, a realidade tem demonstrado que as pessoas agem mais de forma irracional e impulsiva de que com bom senso. O mercado deixado à sua sorte cria assimetrias e um clima de insegurança.

Quando interpretados à letra, os princípios de Smith deixam até a educação, a religião, a medicina e o ambiente à mercê dos mercados. Os gurus transformam-se em empresários, as universidades em negócios e a saúde numa indústria.

O mundo continua desesperadamente em busca de uma “terceira via” entre a total desregulação dos mercados ou o seu controlo excessivo pelo Estado.

Fonte: Fernández-Armesto, F. (2005). Ideias que mudaram o mundo. Civilização.

Glossário

Altruísmo: Amor desinteressado pelo próximo; gosto de fazer bem aos outros.

Guru: Guia ou mentor espiritual.

Laissez-faire: Expressão-símbolo do liberalismo económico: o mercado deve funcionar livremente, sem interferência. Esta filosofia tornou-se dominante nos EUA e nos países ricos da Europa durante o final do século XIX até o início do século XX.

Liberalismo: Doutrina que preconiza a iniciativa individual, a livre concorrência e limita a intervenção do Estado no domínio da economia.

Usuários: Titulares do direito de uso.

“It is not from the benevolence of the butcher, the brewer, or the baker that we expect our dinner, but from their regard for their own interest.” – Adam Smith